Junho 21, 2024
Prema Yoga
Yoga e Liberdade
Ana Pereira
Ser livre. Ser livre será poder fazer o que queremos? Dizer o que pensamos? Ou será algo mais profundo? Claro que é bom saber que não estamos condicionados pelos outros, que podemos escolher o nosso caminho, fazer o que nos dá mais satisfação, dizer o que nos vai na alma e no coração. Mas a liberdade de que falo é mais do que tudo isto. É talvez, no fundo, libertarmo-nos de nós mesmos, dos nossos próprios condicionamentos internos, para além dos externos que falei acima. É poder viver alinhada com o meu coração, fazer as minhas escolhas, ditadas pelo meu coração, que acredito que fala directamente à minha alma, e assim manter a minha verdade e a minha integridade.
É uma liberdade que acontece de dentro para fora. Algo que vai crescendo, desenvolvendo, de que vamos tomando consciência com o tempo e que, por fim, se vai manifestar no exterior. Para mim é saber aceder a um lugar cá dentro, onde consigo aceitar, compreender, tolerar, tudo o que acontece fora, no exterior, e que, de outra forma, sem aceder ao caminho para esse lugar interior, tudo seria mais penoso, difícil e traria muito mais sofrimento.
Esta liberdade interior existe, independentemente das circunstâncias exteriores. É uma liberdade que nos faz sentir paz, calma e tranquilidade com nós mesmos, mas que ao mesmo tempo, e talvez por isso mesmo, também nos dá força interior, resiliência e coragem para avançar e enfrentar os desafios da vida, sejam eles exteriores ou interiores.
Para mim, foi o caminho do yoga que me trouxe a esse lugar interior, ou antes, foi a prática de yoga (e não falo apenas da prática física) que me ensinou o caminho.
Ao seguirmos o caminho do yoga de forma consistente, mesmo que de início não tenhamos a consciência disso, vamos trabalhando os 4 objectivos fundamentais na vida do ser humano, os Purushartha (conceito do Hinduismo): Dharma, Artha, Kama e Moksha. No fundo, aquilo que nos move e nos guia ao longo da vida.
Dharma é a nossa integridade moral para com os outros, com o mundo e connosco mesmos. No fundo a ética e também a missão de vida. É aquilo que sentimos quando temos que tomar uma decisão difícil, mas que bem cá dentro sabemos que é a certa, pois essa certeza tem origem no coração.
Artha tem a ver com a segurança. Não tanto a segurança económica ou financeira, embora tenham também a sua importância, mas mais a segurança que sentimos em sermos quem somos, e no caminho que trilhamos alinhado com o nosso coração.
Kama é aquilo que nos dá prazer, bem-estar físico, mental e espiritual. É saber usufruir e apreciar cada momento, as coisas simples, encontrar prazer nas coisas que fazemos no dia-a-dia, estar atento à beleza nas árvores, às plantas, aos animais, às pessoas à nossa volta e à vida em si.
Moksha leva-nos a valores espirituais ainda mais altos. É a libertação total, a auto-realização interior. É um estado que nos faz transcender alguns destes conceitos de segurança, integridade, segurança, prazer. É libertarmo-nos de todos os nossos desejos, que acabam por ser amarras que nos impedem de chegar a este estado de leveza e contentamento que ultrapassa tudo à nossa volta.
É um estado que talvez consigamos viver por momentos, que dificilmente permanece. No entanto, dá-nos razão para continuar, liga-nos à nossa força vital e ao nosso propósito, que é sermos felizes.
Por isso digo que o caminho do yoga é trabalhoso. Não passa apenas por ir praticar ásanas (posturas) para o tapete, vai muito além disso. É estar atento aos diálogos interiores, às nossas atitudes e às dos outros, é aprender a ser empático, compassivo, tolerante, é tentar constantemente ver para lá do que está à nossa frente, é aprender a viver cada momento de forma cada vez mais plena com a consciência de que é impermanente, e aceitar isso mesmo. É acreditar que haverá sempre algo novo e melhor para viver, é aprender a fluir com as ondas da vida, deixarmo-nos guiar pelo coração e ir assim ao encontro da felicidade, e da liberdade.
Como fazemos tudo isto?
Claro que podemos praticar yoga no tapete (ou na cadeira), pranayama (respiração), concentração/meditação (silêncio), diariamente e consistentemente. Não precisam de ser ásanas difíceis ou pranayamas complicados, nem ficar 1 hora em posição de lótus, para que tudo isto resulte. Mas tem que haver consistência e consciência na prática (abhyasa).
Mas também podemos fazer outras coisas que nos dão prazer e nos libertam a mente e o espírito, como escrever, jardinar, cozinhar, ler, passear, dançar, pintar, enfim, encontrar uma forma de estarmos em união com nós mesmos, com o nosso coração, para podermos senti-lo e ouvi-lo. E assim vamos aprendendo a sermos livres e felizes.
Ana Pereira é a fundadora do Projecto Prema Yoga, em Oeiras, é formada em Yoga na gravidez, pós-parto, bebés, crianças e adultos pela Federação Portuguesa de Yoga e pela Birthlight, UK, e em Massagem Shantala pelo IMT – Instituto de Medicina Tradicional. É ainda formadora no Curso de professores de Yoga para Crianças da FPY, assim como em alguns outros seminários do curso de formação de Yoga: gravidez e pós-parto, bebés e crianças.